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Suíça decide se todos os seus cidadãos receberão R$ 9 mil por mês sem fazer nada

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São Paulo – Os suíços serão os únicos cidadãos no mundo inteiro a poder decidir se o governo deverá pagar uma renda mínima para cada habitante, desde o nascimento até sua morte, independente da renda individual. Os que defendem esta medida acham que a proposta é a solução dos problemas da soberania do capital e da automatização do trabalho. Os opositores da medida alertam para os perigos de uma utopia impraticável.

A iniciativa popular “Por um salário mínimo universal”, que será votada no dia 5 de junho, também está ligada ao debate sobre a ‘sociedade de segunda classe’, que observa que a diferença entre os salários está aumentando cada vez mais. Comparada com iniciativas anteriores, esta iniciativa apresenta uma ótica diferente: a da revolução digital, que ameaça um grande número de postos de trabalho.

Os defensores desta iniciativa acham que se cada cidadão tivesse a garantia de receber um Salário Mínimo Incondicional (BGE) que cobrisse suas necessidades básicas – independentemente de qualquer circunstância – não haveria mais pobreza e nem pessoas dependentes do Auxílio Social que o governo concede. Como consequência, todos poderiam trabalhar exatamente naquilo que gostam. Além disso, a educação formal, a criatividade e o trabalho voluntário seriam incentivados. As pessoas também teriam mais tempo para cuidar de seus filhos e de familiares idosos ou doentes.

Iniciativa vinda do povo

A ideia da iniciativa é de um grupo de cidadãos independentes. Nenhum partido se entusiasmou pela ideia. No Parlamento, todos os políticos de direita e de centro votaram contra. Alguns poucos votos favoráveis vieram dos partidos de esquerda e dos verdes. No Conselho Nacional, a iniciativa foi vetada com 157 votos contra, 19 votos a favor e 19 abstenções. No Conselho dos Estados, apenas a social-democrata Anita Fetz votou a favor.

“Na minha opinião, vale a pena pensar e discutir esta proposta. É uma ideia que poderá ser a solução concreta para algo que deve acontecer dentro de 20 ou 30 anos, com a crescente digitalização do trabalho e a grande diminuição de postos de trabalho que deverá ocorrer”, defende a deputada do cantão de Basileia.

“Considero a iniciativa uma ideia pioneira, mas impossível de ser implementada”, afirma Raymond Clottu, membro do Conselho Nacional pelo Partido do Povo Suíço (SVP) de Neuchâtel. Ele ressalta os “enormes custos” que esta iniciativa acarretaria.

Como funcionaria?

Segundo a proposta da iniciativa, os cidadãos que não exercem atividade remunerada receberiam o Salário Mínimo Incondicional (BGE), enquanto que a renda de atividade remunerada seria contabilizada até o valor do salário minímo incondicional e seria substituída pelo salário. Quem ganhasse o mesmo valor do salário mínimo ou mais, teria, com o salário mínimo, a mesma renda que possui hoje.

Por exemplo, uma pessoa que ganha um salário de CHF 1.500, se o salário mínimo for de CHF 2.500, teria CHF 1.000 a mais de renda. Já uma pessoa que ganha CHF 2.500 de salário ficaria com a renda inalterada. Se alguém ganha, por exemplo, CHF 6.500, CHF 2.500 seriam descontados para financiar o salário mínimo e a pessoa ficaria no final com uma renda de CHF 4.000. Mas com os CHF 2.500 do salário mínimo que a pessoa também receberia, ela teria no final os mesmos CHF 6.500 por mês.

O mesmo mecanismo seria utilizado para quem recebe auxílio da Previdência Social. Até o limite de CHF 2.500, o valor seria compensado pelo salário mínimo. O valor que excedesse esta quantia seria completado pela Previdência.

Desta forma, espera-se cobrir 88% dos custos do Salário Mínimo Incondicional (BGE). Os 12% restantes teriam que ser financiados de outra maneira, por exemplo através de impostos extras.

“O salário mínimo garantiria uma existência digna para toda a população e uma participação de todos na vida pública”, é o que está escrito no texto proposto e o que deveria constar da Constituição Federal em caso de aprovação. O Legislativo se encarregaria de estabelecer o valor do Salário Mínimo Incondicional (BGE). Os defensores da iniciativa estabeleceram um valor- base de discussão de CHF 2.500 mensais para adultos e de CHF 625,- mensais para menores de idade.

“Com base no recenseamento demográfico de 2012, o custo anual desta medida para o governo federal suíço seria de 208 bilhões de francos. Isso corresponde a 35% do Produto Interno Bruto. É estarrecedor!”, exclama Raymond Clottu.

O texto da iniciativa não estabelece uma possível forma de financiamento dos custos. O financiamento teria que ser decidido pela lei de implementação da iniciativa, caso a iniciativa seja aprovada. Os defensores da iniciativa sugerem que o salário mínimo incondicional seja financiado através de cotas dos salários mais altos e de repasses dos valores gastos atualmente com a previdência social. O restante – cerca de 25 bilhões de francos suíços – seria levantado através da arrecadação de impostos e do remanejamento do orçamento federal.

“Num período como agora, obter mais 25 bilhões através de arrecadação de impostos parece-me impossível”, ressalta Raymond Clottu. Uma proposta dos que desenvolveram a iniciativa é aumentar o Imposto sobre Valor Agregado. Na prática, este aumento do imposto acarretaria um aumento linear dos preços da ordem de 8%. “Isso significa que o poder aquisitivo dos suíços ficaria menor, e a economia nacional ficaria mais fraca”, acrescenta Clottu, membro do Conselho Nacional.

“Eu também sou contra o aumento do Imposto sobre Valor Agregado”, afirma Anita Fetz. “Mas esta é apenas uma sugestão entre outras. Houve quem sugerisse um mini-imposto sobre transações financeiras. Para mim este seria o caminho correto, e também um imposto sobre computadores. Pois se a discussão é sobre a perda de postos de trabalho por causa da digitalização, a solução para o financiamento também poderia ser buscada neste caminho.”

Antecipar, mas como?

Segundo Anita Fetz, do Conselho dos Estados, é “um equívoco começar agora a discussão sobre o financiamento. O Salário Mínimo Incondicional (BGE) não é uma medida para ser tomada de um dia para o outro. A questão é o que uma sociedade deve fazer quando os rendimentos tradicionais, gerados através do trabalho, não mais existem. Quando a automatização e os programas de computador cada vez mais sofisticados começam a substituir uma grande parte dos postos de trabalho em todas as profissões, das mais simples às que exigem maior qualificação. Somos obrigados a encontrar uma solução”. Afinal é melhor prevenir do que remediar.

“Com esta iniciativa não prevenimos nada, apenas colocamos a carroça na frente dos bois”, contesta Raymond Clottu. “Com o tempo, teremos que refletir como gerar renda. Mas apesar da pseudo-robotização, sempre vamos precisar de pessoas. Atrás de um computador, em princípio, tem que haver uma pessoa. Algumas profissões vão desaparecer, mas novas irão surgir. Antecipar e prevenir, na minha opinião, significa fortalecer os laços entre a economia e o sistema de educação. E no quesito educação, temos que ficar atentos ao desenvolvimento tecnológico e evoluir em conformidade com as necessidades da economia.”

Outra crítica ao Salário Mínimo Incondicional (BGE) – tanto por parte da esquerda como por parte da direita – é que todo o sistema social da Suíça é colocado em cheque. “Mas o Salário Mínimo Incondicional não substituiria todos os casos de seguro social”, argumenta Anita Fetz. “Atualmente existem 13 tipos de seguro social. Uma redução destas modalidades poderia ser uma oportunidade para o sistema social suíço se adaptar aos novos desafios.” Ela ressalta que não seria mais possível continuar usando um sistema que se baseia no princípio de pleno emprego enquanto grandes mudanças se delineiam no horizonte.

Na opinião de Raymond Clottu, com o Salário Mínimo Incondicional, a Suíça arriscaria “a minar um sistema que, embora não seja perfeito, funciona muito bem e motiva as pessoas a continuar trabalhando e a investir em formação profissional continuada. Temos que tentar melhorar este sistema, consolidá-lo”, e não introduzir uma aposentadoria que sobrecarrega os assalariados e os empresários e “desmotiva as pessoas a trabalho.

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