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Jovem brasileiro quer ser o 1º médico a imprimir um coração

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São Paulo – Aos dois anos, Gabriel Liguori teve o pequeno coração operado no Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, para tratar uma cardiopatia congênita. As idas e vindas ao hospital forjaram sua paixão pela medicina, em especial pela cirurgia cardíaca pediátrica, e ele se formou médico na Universidade de São Paulo. Hoje, aos 26 e bolsista da Fundação Estudar, é doutorando na Universidade de Groningen e quer fazer da vida o que salvou a sua. “O que poderia ser um trauma acabou virando uma paixão”, resume.

A ligação com as ciências se fortaleceu na infância. Sem poder praticar esportes, Gabriel passava o tempo lendo de tudo, de Charles Darwin à mecânica quântica. Nas férias, chegava a terminar dez livros por mês. “Também sempre gostei de colocar meus aprendizados em prática e não foram poucas as vezes em que quase botei fogo em casa ou enchi o banheiro com larvas de drosófila”, lembra.

Os laços com o InCor, que faz parte do complexo do Hospital das Clínicas operado pela USP, também se mantiveram ao longo dos anos. Gabriel era figura tão frequente pelos corredores – as visitas eram uma atividade extracurricular para ele – que foi convidado a acompanhar um transplante de coração ainda no terceiro ano de faculdade.

A ligação, que pode vir a qualquer hora, veio em 7 de setembro de 2011. “Lembro-me de ser chamado para acompanhar a retirada do coração do doador – essa também foi a primeira vez que entrei numa ambulância – e seguimos até o local onde seria realizada a coleta. Acompanhei toda essa cirurgia e corremos de volta para o InCor”, conta.

Gabriel acompanhou então o transplante em si. Quando estava tudo quase concluído, foi convidado a chegar mais perto. “Foi primeira vez que toquei num coração batendo, recém transplantado no peito daquela criança”, diz. “Sentir esse coração na minha mão foi, com certeza, uma das melhores sensações até hoje e o momento que me fez ter certeza que era isso que eu queria.”

Águas internacionais Antes de se tornar bolsista da Fundação Estudar e começar seu doutorado, Gabriel passou um período em Harvard fazendo o curso “Principles and Practice of Clinical Research” e estagiando no Children’s Hospital Boston, onde acompanhou cirurgias cardíacas. O Hospital é considerado em diversos rankings o melhor dos Estados Unidos na área pediátrica.

“O período que passei em Harvard foi um grande catalizador da minha vontade de fazer pesquisa científica inovadora e de qualidade”, resume ele, que se encantou com o ambiente universitário. “Boston e Cambridge respiram ensino e pesquisa, e espero que eu e meus colegas da Fundação Estudar, ao voltarmos, possamos criar uma rede de desenvolvimento acadêmico e trazer essa realidade das universidades americanas e europeias para o país.”

Gabriel também estagiou em Londres, onde analisou dezenas de corações da coleção do Royal Bromptom Hospital para estudar uma doença chamada Tronco Arterial Comum, e na cidade holandesa de Maastrich, que suscitou seu interesse pelo país.

“Às vezes, quando pensamos em estudar no exterior, enxergamos apenas EUA ou Inglaterra”, diz. “A verdade é que existem muitas outras oportunidades e a Holanda, como terceiro maior produtor de conhecimento do mundo e com quase 90% da população falante do inglês, é uma excelente opção.”

Em 2015, fez as malas e mudou-se com a namorada para a Universidade de Groningen, onde se dedica a pesquisar engenharia de tecidos e o desenvolvimento de próteses cardiovasculares. “Traduzindo, meu objetivo é construir tecidos para serem utilizados durante a cirurgia cardíaca, como vasos e valvas, com as células-tronco do próprio paciente.”

Futuro no 3D Parece futurista, mas ele garante que não é. Gabriel também tem interesse especial pela promessa da impressão 3D, tanto objetos de plástico quanto aqueles feitos com biomaterial, e inclui a tecnologia em suas pesquisas.

“Basicamente, a engenharia de tecidos procura organizar polímeros, células e biomoléculas de maneira a construir tecidos vivos para a reposição e regeneração de órgãos ou parte deles”, explica.

E enquanto o método tradicional de engenharia falha na hora de criar as microestrutura de tecidos mais complexos ou órgãos inteiros, uma bioimpressora pode mudar este quadro. “Ela surge como uma solução, uma vez que possibilita a alocação de maneira pré-definida e organizada.”

A criação artificial de órgãos é uma frente promissora na ciência médica, já que pode diminuir significativamente o número de pacientes esperando por um doador na fila de transplantes. Para se ter uma ideia, em 2014, para acabar com a fila de transplante de órgãos no Brasil eram necessários 62820 órgãos doados, desconsiderando as demandas de córnea.

Coração bioartificial De acordo com o cronograma de Gabriel, a segunda fase do doutorado, que envolve o testes das próteses, deve acontecer já no Brasil. Será mais um passo rumo ao principal sonho de Gabriel. “Quero fabricar e transplantar o primeiro coração bioartificial no país e, quem sabe, no mundo”, diz.

Ele estima que ainda leve outros 15 anos até atingir seu objetivo, mas está otimista com o avanço tecnológico. É uma notícia que deve alegrar instituições como a Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos. Segundo a ABTO, há 32 mil brasileiros na fila por um órgão compatível – mais de duzentos deles à espera de um novo coração.

“Há um século, as pessoas morriam devido a infecções que agora são facilmente tratadas com antibióticos”, destaca o doutorando. “Hoje, o câncer e as doenças cardiovasculares são o grande desafio, mas daqui cem anos acredito que poderemos ser imortais.”

*Este artigo foi originalmente publicado pelo Na Prática, portal da Fundação Estudar.

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